"O Brasil do futuro não vai ser o que os velhos historiadores disserem e os de hoje repetem. Vai ser o que Gilberto Freyre disser. Freyre é um dos gênios de paleta mais rica e iluminante que estas terras antárticas ainda produziram".
Biografia
Filho de Alfredo Freyre (juiz e catedrático de Economia Política da Faculdade de Direito do Recife) e de Francisca de Mello Freyre, Gilberto Freyre é de família brasileira antiga, descendente dos primeiros colonizadores portugueses do Brasil. Em suas palavras: "um brasileiro que descende de gente quase toda ibérica, com algum sangue ameríndio e fixada há longo tempo no país". Tem antepassados portugueses, espanhóis, indígenas e holandeses. Custou a aprender a escrever, fazendo-se notar pelos desenhos. Teve aulas particulares com o pintorTeles Júnior, que reclamava de sua insistência em deformar os modelos. Começou a aprender a ler e escrever em inglês com Mr. Williams, que elogiava seus desenhos.[carece de fontes?]
Em 1909, faleceu sua avó materna, que vivia a mimá-lo por supor que teria problemas sérios de aprendizado, pela sua dificuldade em aprender a escrever. Nessa época, ocorrem suas primeiras experiências rurais de menino de engenho, quando passa uma temporada no Engenho São Severino do Ramo, pertencente a parentes seus. Mais tarde escreverá sobre essa primeira experiência numa de suas melhores páginas, incluída em Pessoas, coisas & animais.[carece de fontes?]
Quando jovem, tornou-se protestante batista, chegando a ser missionário e a frequentar igrejas batistas norte-americanas.[7] Foi estudar nos Estados Unidos, mas quando desencantou-se com o protestantismo batista tornou-se sem religião, embora esposando uma cosmovisão cristã e vendo com simpatia o catolicismo popular e o xangô do Recife.[8]
Foi casado com Madalena Guedes Pereira Freyre, mãe de seus dois filhos, Sônia e Fernando.[9]
Educação
Gilberto Freyre inicia seus estudos frequentando, em 1908, o jardim da infância do Colégio Americano Batista Gilreath, que seu pai havia ajudado a fundar.[10]
Freyre estudou na Universidade Columbia nos Estados Unidos, onde conheceu Franz Boas, referência intelectual para ele.[11] Em 1922 publica sua tese de mestrado Social life in Brazil in the middle of the 19th century (Vida social no Brasil nos meados do século XIX), dentro do periódico Hispanic American Historical Rewiew, volume 5. Com isto, obteve o título Masters of Arts.[8][12]
Seu primeiro e mais conhecido livro é Casa-grande & senzala, publicado no ano de 1933 e escrito em Portugal. Nele, Freyre rechaça as doutrinas racistas de branqueamento do Brasil. Baseado em Franz Boas, demonstrou que o determinismo racial ou climático não influencia no desenvolvimento de um país. Ainda, essa obra foi precursora da noção de democracia racial no Brasil, com relações harmônicas interétnicas que mitigariam a influência social do passado da escravidão no Brasil, que, segundo Freyre, fora menos segregadora que a norte-americana. Embora seja sua obra mais importante, também recebeu críticas por diversos aspectos do livro, como críticas à linguagem da obra, considerada vulgar e obscena[14] e críticas ao que é chamado por parte dos estudiosos de "mito da democracia racial", que segundo a filósofa Djamila Ribeiro é uma "visão [que] paralisa a prática antirracista, pois romantiza as violências sofridas pela população negra”.[15] Muito embora Freyre seja considerado o ideólogo da democracia racial, esse conceito não foi abordado diretamente em Casa-grande & senzala.[16] Em Recife, chegou a ter seu livro queimado em praça pública, ato apoiado por um colégio religioso da cidade.[14]
Ao contrário do que popularmente se imagina, Casa-grande & senzala não é um estudo sociológico ou antropológico. Baseado em fontes históricas e suas reflexões, Gilberto Freyre se apresentou como um "escritor treinado em ciências sociais" e não como sociólogo ou antropólogo, como refletiu em seu Como e porque sou e não sou sociólogo (1968). Além disso, por influência de Franz Boas sabia da necessidade de pesquisas empíricas para validar um estudo como sendo sociológico ou antropológico.[17]
Em 1930, após a tomada do poder por Getúlio Vargas, Freyre viaja aos Estados Unidos e Portugal, onde trabalhou no manuscrito de Casa Grande & Senzala.[carece de fontes?]
Em Pernambuco, Gilberto Freyre ocupou vários cargos comissionados e chegou à presidência da UDN pernambucana. Em 1942 foi preso e espancado, junto de seu pai, após escrever um artigo no Diário de Pernambuco acusando um monge beneditino de Olinda de ser racista e pró-nazista. Em 1946, foi eleito pela própria UDN para a Assembleia Constituinte. Em 1964, defendeu a queda de João Goulart, e em 1969 passou a integrar o Conselho Federal de Cultura a convite do presidente general Emílio Médici.[19]
Gilberto Freyre foi também reconhecido por seu estilo literário. Ele escreveu um longo poema inspirado por sua primeira visita à Cidade de Salvador: Bahia de todos os santos e de quase todos os pecados. Impresso no mesmo ano em reduzidíssima edição da recifense Revista do Norte, o poema deixou Manuel Bandeira entusiasmado. Tanto que em carta de 4 de junho de 1927 escreveu: “Teu poema, Gilberto, será a minha eterna dor de corno. Não posso me conformar com aquela galinhagem tão gozada, tão envergonhosamente lírica, trescalando a baunilha de mulata asseada!”.[20] Os dois chegariam a trocar 68 cartas durante décadas.[21] O poema tem três versões: a primeira foi reproduzida por Manuel Bandeira em sua Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos (1946); a segunda, modificada pelo autor, foi publicada na revista carioca O Cruzeiro de 20 de janeiro de 1942; e a terceira aparece nos livros Talvez Poesia (José Olympio, 1962) e Poesia Reunida (Edições Pirata, 1980).[22]
Portugal ocupa um lugar importante no pensamento de Freyre.[23][24] Em vários de seus livros, como em "O Mundo que o Português Criou", "O Luso e o Trópico" demonstra o importante papel que os portugueses tiveram na criação da "primeira civilização moderna nos trópicos": o Brasil. A visão positiva que ele difundiu a respeito da atuação dos portugueses na América, África e Ásia, colaborou para legitimar o discurso colonial promovido pelo regime salazarista[18]. Freyre foi um dos pioneiros no estudo histórico e sociológico dos territórios de colonização portuguesa como um todo, chegando mesmo a desenvolver um ramo de pesquisa que denominou de "Lusotropicologia", concepção formada com base no lusotropicalismo.[carece de fontes?]
Suas reflexões sobre temas como iberismo, hispanismo, latino-americanismo, relações entre as Américas e diversidade cultural do continente estão fortemente relacionadas e imbricadas às suas interpretações sobre a formação social e cultural do Brasil.[carece de fontes?]
Em sua visão do passado escravocrata e a coexistência dos povos no Brasil, Freyre antecede as questões contemporâneas do multiculturalismo como política de uma ideal inclusão harmônica.[25] O historiador George Reid Andrews sumariza a posição de Freyre frente à questão:
"Os proponentes do branqueamento tinham buscado europeizar o Brasil e torná-lo branco; Freyre, em contraste, aceitou que o Brasil não era nem branco nem europeu, e que nunca o seria. Em vez de a Europa dos trópicos, o Brasil estaria destinado a ser um novo mundo nos trópicos: um experimento exclusivamente americano no qual europeus, índios e africanos tinham se juntado para criar uma sociedade genuinamente multirracial e multicultural".[26]
A visão que Freyre tinha para acomodar as diferenças étnicas no Brasil, por vezes chamada de democracia racial brasileira, como citado, previa um ideal político de coexistência da diversidade. Todavia, ao contrário da acepção do termo erroneamente atribuído a ele, Freyre não via o Brasil como uma "democracia racial" no sentido de ausência de racismo.[27]
"Cavaleiro-Comendador da Ordem do Império Britânico" (Honorary Ordinary Knight Grand Cross Division of the Order of the British Empire), distinção conferida pela Rainha da Inglaterra, 1971[30]
Medalha Joaquim Nabuco, Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco, 1972
Troféu Novo Mundo, por "obras notáveis em Sociologia e História", São Paulo - Troféu Diários Associados, por "maior distinção atual em Artes Pláticas" - Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, 1973
Vencedor do Prêmio Esso em 2005
Medalha de Ouro José Vasconcelos, Frente de Afirmación Hispanista de México, 1974
Educador do Ano, Sindicato dos Professores do Ensino Primário e Secundário em Pernambuco e Associação dos Professores do Ensino Oficial, 1974
Medalha Massangana, Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, 1974
Grã-cruz Andrés Bello da Venezela, 1978
Grã-cruz da Ordem do Mérito dos Guararapes do Estado de Pernambuco, 1978
Prêmio Brasília de Literatura para Conjunto de Obras, Fundação Cultural do Distrito Federal, 1979
Prêmio Moinho Recife, 1980
Medalha da Ordem do Ipiranga do Estado de São Paulo, 1980
↑Siepierski. Paulo D. O ideário protestante nos artigos de jornal do aprendiz
↑ abcRAMOS JR., José de Paula. O jovem Gilberto Freyre. Rev. USP, São Paulo, n. 88, fev. 2011. Disponível em <revistasusp.sibi.usp.br[ligação inativa]>. acessos em 28 out. 2012.
↑Um pensador de raça. Veja. São Paulo: edição 986, 29 de julho de 1987, pág. 84-85.
↑«Usina de Letras». www.usinadeletras.com.br. Consultado em 13 de julho de 2021
↑scielo.br | ANDREWS, George Reid. Democracia racial brasileira 1900-1990: um contraponto americano. Estud. av., São Paulo, v. 11, n. 30, p. 95-115, Agosto de 1997. Disponível em <scielo.br>. acessado em 7 de setembro de 2017. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40141997000200008.
↑SANTOS, Luiz Antonio de Castro. O pensamento social no Brasil: pequenos estudos. Campinas: Edicamp, 2003. Pp.21-39